Em meio a um cenário econômico ainda instável, com a inflação oscilando e o poder de compra da população pressionado, a notícia de que os medicamentos terão o menor reajuste médio desde 2018 chega como um sopro de alívio — ao menos na teoria. Segundo a resolução da Câmara de Regulação do Mercado de Medicamentos (CMED), publicada no Diário Oficial da União, o teto do reajuste para 2025 foi fixado em 5,06%, um valor que empata com o índice oficial de inflação (IPCA) acumulado em 12 meses.

Mas será que isso realmente significa que os remédios vão “ficar mais baratos” no bolso do brasileiro? A resposta, como quase tudo na política de preços do Brasil, é: depende.

📉 Entenda os Níveis de Reajuste

A estrutura do reajuste é dividida em três faixas, baseadas na concorrência de mercado:

  • Nível 1 (mercado mais competitivo): reajuste de até 5,06% (7,8% dos medicamentos)
  • Nível 2: até 3,83% (15% dos medicamentos)
  • Nível 3 (mercado menos competitivo): até 2,6% (77,2% dos medicamentos)

Ou seja, mais de 77% dos medicamentos terão um reajuste médio abaixo da inflação, o que, à primeira vista, parece positivo. Mas nem tudo é tão simples.

🧾 O Preço no Papel Não é o Preço na Farmácia

A resolução da CMED define o preço máximo permitido, mas não o preço praticado no balcão da farmácia. E há uma distância considerável entre esses dois universos. O reajuste também depende da renovação de estoques — enquanto os estoques antigos durarem, os preços “antigos” ainda serão aplicados. O consumidor só começa a perceber os reajustes na prática semanas, ou até meses, depois da publicação da resolução.

Além disso, há outros fatores que influenciam o preço final: logística, variação cambial (muitos insumos são importados), carga tributária e até as próprias estratégias de precificação das redes farmacêuticas.

🧮 A Fórmula do Reajuste: Um Cálculo Técnico, Mas Nem Sempre Claro

O reajuste não é feito de forma aleatória. Ele considera uma fórmula que inclui:

  • Inflação (IPCA)
  • Fator X: ganho de produtividade da indústria
  • Fator Y: custos não captados pela inflação, como energia e dólar
  • Fator Z: grau de concorrência do mercado

Na teoria, é um modelo técnico e transparente. Na prática, boa sorte tentando entender ou auditar todos esses números. A falta de clareza sobre como exatamente cada fator pesa na conta gera desconfiança e abre margem para críticas, especialmente quando o consumidor continua sentindo o preço dos remédios subir, mesmo quando o reajuste oficial é “menor”.

🗣️ Menor Reajuste Desde 2018: Mérito Real ou Obrigação Moral?

Celebrar um reajuste “menor” pode até ser uma boa manchete, mas não deixa de ser uma forma de suavizar uma realidade incômoda: os medicamentos continuam subindo, mesmo em um país onde parte considerável da população depende deles diariamente para sobreviver.

Num país em que 55% dos trabalhadores ganham até dois salários mínimos, reajustar o preço de medicamentos básicos, ainda que em ritmo menor, é como apertar mais uma volta no cinto de quem já está sem fôlego. Reduzir o reajuste pode ser mérito técnico, mas deveria ser obrigação moral — especialmente em tempos de crise.

💬 Conclusão

A notícia de que os medicamentos terão o menor reajuste médio desde 2018 é, sim, positiva. Mas é importante ir além da manchete. O impacto real no bolso do consumidor dependerá de muitos outros fatores. E mais do que reajustar menos, o que o Brasil precisa é de uma política de medicamentos mais justa, acessível e transparente.

Afinal, saúde não deveria ser um luxo — e muito menos uma estatística.

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